Professor vê direito à desconexão no teletrabalho como direito fundamental
- Página atualizada em 28/11/2023
Partindo da consideração do jurista francês Alain Supiot de que, “pelo contrato de trabalho, o trabalhador abdica de uma parte da sua liberdade para se colocar em subordinação a outrem”, mas somente uma parte, o professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, João Leal Amado, afirmou que a limitação do tempo de trabalho é uma preocupação que acompanha o Direito Trabalhista desde o seu nascimento. O tema foi debatido no Congresso Internacional Os Impactos das Novas Tecnologias no Mundo do Trabalho na tarde da quinta-feira (23/11).
Ele acrescentou que o intuito é criar e preservar “a própria noção de tempo livre, de tempos de não trabalho durante a vigência do contrato”, um desafio agravado pelas novas tecnologias, tendo em vista as “impressionantes mudanças na nossa forma de viver, comunicar e trabalhar, com a informatização, a internet, as redes sociais, os telemóveis, os computadores”, que favorecem “a diluição das fronteiras entre vida profissional e vida pessoal”.
Conforme João Amado, a relação entre tempo e teletrabalho põe em dúvida se esta modalidade de trabalho constitui instrumento de conciliação ou de confusão entre vida privada e profissional. Ele frisa que “o trabalho que acompanha o trabalhador, seja quando for e onde quer que este se encontre” torna o trabalhador conectado e disponível por 24 das 24 horas diárias.
“A tecnologia permite a conexão por tempo integral (hiperconexão), potencializando situações de quase escravização do trabalhador, visto como ‘colaborador’, de quem se espera dedicação permanente e ilimitada”, analisou o professor português, acerca do que chama de cultura da disponibilidade permanente. Ele ressaltou que isso pode conduzir o obreiro a síndrome de burnout (ou esgotamento), distúrbios do sono, problemas de saúde física e mental e diminuição da produtividade.
João Amado ressalta que a Resolução do Parlamento Europeu, de janeiro de 2021, reconheceu o direito a desligar (desconexão) como direito fundamental “da nova organização do trabalho na nova era digital”. A intenção, segundo ele, foi criar regras novas para combater a cultura empresarial da disponibilidade permanente do trabalhador. “Mais do que como um direito do trabalhador, a legislação deve conceber a desconexão como um dever do empregador, uma obrigação deste”, defendeu.
Ana Carolina Zaina, desembargadora presidente do Coleprecor (Colégio de Presidentes e Corregedores dos TRTs) foi a presidente de mesa da palestra.