Família de eletricista morto por afogamento em riacho durante trabalho deve ser indenizada
- Página atualizada em 12/04/2022
A família de um eletricista morto por afogamento ao atravessar um riacho para tentar restabelecer o sinal de energia no município de Sobral, zona norte do Ceará, deverá ser indenizada pela Companhia Energética Enel. O caso foi apreciado pela 1ª Vara do Trabalho de Sobral, município distante 220km de Fortaleza. De acordo com a decisão proferida pelo juiz do trabalho substituto Raimundo Dias de Oliveira Neto, além da indenização de R$ 150 mil a título de danos morais a cada um dos herdeiros (viúva e três filhos, com idades de 15, 13 e 6 anos), a empresa deverá arcar com pensão mensal arbitrada em meio salário mínimo para cada filho até que eles completem 18 anos.
O caso aconteceu no dia 26 de abril de 2020, quando o eletricista estava de sobreaviso e foi chamado para atendimento emergencial no distrito de Patriarca. Para restabelecer o sinal de energia (acionamento de chave), precisou atravessar o riacho Madeira. Segundo relatado à Vara Trabalhista pelo companheiro de serviço do trabalhador na ocasião, que depôs em favor da empresa, ele alertou a vítima sobre a inviabilidade da travessia em razão da situação do rio, mas um pescador ofereceu ajuda e o eletricista aceitou. Quando a água começou a levar o trabalhador, a testemunha conta que contatou a empresa para chamar os Bombeiros com urgência. Somente cerca de duas horas depois, o corpo foi localizado por pescadores.
As testemunhas da empresa e do trabalhador falecido admitiram não ter recebido treinamento para travessia de regiões alagadas. O representante da empresa afirmou perante o juiz que a Enel tinha conhecimento de que, no mês de abril, quando ocorreu o fato, o rio alagava, mas não que a passagem ficava intransitável.
Em parecer emitido no processo, o Ministério Público do Trabalho (MPT) observou que a empresa não apresentou ordem de serviço que deveria conter a descrição do atendimento, os procedimentos de trabalho e segurança, nem a necessária análise de risco que descreve o local de execução, as condições meteorológicas, a utilização e limitação dos sistemas de proteção coletiva e individual, além dos riscos e condições impeditivas e as situações de emergência e planejamento de resgate e primeiros socorros.
A Enel alegou que cumpriu todas as regras de segurança no trabalho e apontou culpa exclusiva da vítima tendo em vista que ele teria direito de recusa. No entanto, o magistrado apontou na sentença que “a mera insistência do colega de equipe para que o falecido não entrasse no rio não é suficiente para caracterizar a culpa da vítima”. Ele acrescentou que a segurança no trabalho não pode ser transferida de modo exclusivo ao trabalhador quando a empresa deixou de cumprir os procedimentos mencionados pelo MPT.
“As omissões e negligências da reclamada quanto à adoção de medidas de prevenção do acidente de trabalho demonstram a sua participação culposa no evento danoso”, concluiu o juiz. Ele proferiu sentença em dois processos, o primeiro ajuizado ainda em 15/9/2020 por uma das filhas do empregado falecido, e o segundo em 18/5/2021, pela viúva e os outros dois filhos da vítima.
Sobre o valor da condenação, o magistrado afirma que “não se mede a dor de uma perda, mas, se deve considerar as circunstâncias do acidente, a vida ceifada do trabalhador, precocemente, a privação causada à família do seu convívio e a repercussão na vida pessoal, familiar e social dos herdeiros diretos”. Ele acrescenta que o valor recebido da Previdência não se mostra suficiente ao sustento dos infantes. A empresa foi condenada, ainda, a pagar as verbas rescisórias: saldo de salário, horas extras, 13º salário proporcional, férias proporcionais, entre outras, estimadas em pouco mais de R$ 12 mil.
A empresa já interpôs recurso ordinário, que será examinado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região.
(Processos relacionados: 0000451-98.2021.5.07.0024 e 0000863-63.2020.5.07.0024)